"Será pública a escola pública?"

Mariano Fernández Enguita

Enguita, M. F. (2008). Será pública a escola pública?. In J. M. Paraskeva (Org.), Educação e poder: abordagens críticas e     pós-estruturais. Mangualde: Edições Pedagogo. Pp. 97-108. 

     No início do capítulo, Mariano Fernández Enguita, dá a perceber ao autor que o título do seu texto é extremamente crítico e, ao mesmo tempo, abarcador de visões distintas. Por isso mesmo, tem como princípio deixar claro que, no meio de tantas questões que podem ser levantadas, se refere à escola do estado. Logo de seguida, reforça também que pretende dar enfâse a questões da ordem de interesses, ou seja, para perceber se realmente os desejos púbicos (da sociedade em geral) ficam sobrepostos por interesses da classe docente ou não docente.

    Como leitor reflexivo que sou sobre o que leio, desde cedo me apercebi que o capítulo era não mais que uma dura referência ao quotidiano escolar público e, embora o autor desnude a realidade espanhola, deu para perceber que é um pouco do que se passa, também, no contexto educativo português.

     As críticas começam por incidir sobre os funcionários públicos, da escola, e sobre o nevoeiro que está em torno tanto dos seus privilégios, tanto da falta de controlo sobre o trabalho que realizam. Estarão estes privilégios mais próximos dos interesses públicos, ou dos interesses do público? Para o autor, estão perto dos primeiros, porque o ensino privado em Espanha é caraterizado pela base ideológica que, automaticamente, significa o afastamento dos alunos "problemáticos". Por outro lado, também não estão próximos do segundo, pois a relação que o professor estabelece com o aluno é uma relação de clientela.

     Centrado, novamente, na questão explícita no título, o autor refere que se a escola for financiada por fundos públicos isso significa que é pública e os seus funcionários são igualmente públicos. Mas num mundo onde se discute o "modelo educativo global", esta questão nem sempre é tão transparente como aparenta ser. Mas, seguindo um fio condutor desde o início, o autor acaba por cair em mais uma questão: "será que a lei e a titularidade estatal bastam para garantir que a denominada escola pública seja inequivocamente pública?". Para o autor, a resposta é clara: não!

     Para Mariano Enguita, a escola sofre de subordinação de interesses privados (de cada professor e/ou conjunto de professores) sobre os interesses do público (alunos e sociedade em geral). Para estas anomalias se verificarem, são vários os fatores que as alimentam, logo por começar pelo défice negativo de reformas dos calendários e horários escolares. Mesmo atividades que seriam benéficas para os alunos, acabaram por ser projetos nunca saídos do papel e tudo isto levou a muitas famílias recorram à escola privada (para encontrem calendários e horários mais flexíveis, bem como para atividades e serviços mais eficientes).

     Em segundo lugar, os professores não aproveitam o seu tempo disponível para preparem aulas, renovarem programas ou aprimorarem o desenvolvimento profissional. Como os docentes não são obrigados, legalmente, a fazer isto acabam por deixar tais tarefas de lado. Em terceiro lugar, a falta de ideias inovadoras dos docentes em sala de aula, sendo que boa parte deles contínua amarrado única e exclusivamente ao manual escolar.

     Logo de seguida, como quarta anomalia, o autor critica o desinteresse da classe docente no que consta ao envolvimento ativo nos problemas da escola. Em quinto lugar, a própria Direção do estabelecimento escolar, que tem vindo a desmoronar-se, uma vez que os docentes se têm tornado nos donos tanto da turma como da sala de aula, não fornecendo quaisquer tipo de satisfações. Por último, em sexto lugar, está o baixo nível profissional entre colegas de profissão e em que o autor refere que a escola está em guerra e o inimigo está lá dentro. Tudo isto, tem resultado num caos que não tem fim e em níveis de migração de alunos cada vez maiores, que saem da escola pública para a privada.

     Como tentativa de justificar todo o mal-estar que se vive no seio escolar espanhol, Mariano Enguita trás à discussão mais três razões: a "feminização", a "desvocacionalização da profissão" e a "irresponsabilidade acomodatícia dos sindicatos".

     A primeira razão está relacionada com a entrada gradual da mulher nos contextos de trabalho, que acabam por resultar numa dupla responsabilidade. Ou seja, as docentes para além do seu trabalho profissional estão ainda ligadas às tarefas domésticas. Quando inseridas em contextos privados, elas são obrigadas a empregos em tempo parcial e mais precários; quando em contexto público é possível que exista uma redução de obrigações laborais, o que mais uma vez prejudica o sistema de ensino em geral e os discentes em particular.

     Em segundo lugar, a profissão de professor, nos dias que correm, está desvocacionalizada. No passado, os professores eram antigos bons alunos que viram na escola o seu espaço de ação e de oportunidades inéditas. Porém, atualmente, os alunos das licenciaturas em ensino são aqueles cuja a média não permitiu a entrada num outro qualquer curso superior.

     Por fim, culpa as classes sindicais que procuram a resolução de problemas, a melhoria de condições de trabalho bem como a qualidade da escola pública. Porém, pouco fazem para que as mudanças aconteçam e acabam por se acomodar com os factos e as suas ideias de mudança não passam de ideias.

     Para concluir, refiro que foi muito importante a leitura que fiz deste capítulo, pois acabei por refletir sobre muitos dos problemas que hoje residem no contexto escolar português. Embora o autor tenha retratado o quotidiano do ensino em Espanha, os problemas que ele menciona são transfronteiriços. Mesmo a nível pessoal e académico, o texto é um abre olhos a um Licenciado em Educação que, embora fora da classe docente, poderá ter um papel extremamente ativo e importante no contexto escolar. Por fim, só posso recomendar a leitura do texto de Mariano Fernández Enguita. 

Licenciatura em Educação - Universidade do Minho 
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